Mônica Cardoso
A alfabetização é a base da vida escolar. A questão vai além da escola, já que o domínio da leitura e escrita é essencial para garantir a possibilidade de exercer plenamente sua cidadania. Com a proposta de alfabetizar todas as crianças até os 8 anos de idade, ao fim do 3º ano do Ensino Fundamental, o Ministério da Educação (MEC) desenvolve o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic), iniciado em 2013 e que, em 2015, chegou ao seu 3º ciclo.
O professor alfabetizador é um dos eixos do Pnaic, que promove cursos presenciais de formação continuada. Se no 1º ciclo do Programa, realizado em 2013 e 2014, os professores receberam formação em Língua Portuguesa, e no segundo, em 2014 e 2015, em Matemática, a proposta do 3º ciclo, que ocorre em 2015 e 2016, é a interdisciplinaridade, com a integração de áreas como Artes, Ciências Humanas e Ciências da Natureza.
“A formação continuada é a forma pela qual o profissional se coloca diante de novos conhecimentos, confronta sua prática com a teoria, se apropria de outras formas de pensar e conceber o que faz, como faz e por que faz. O fundamento da aprendizagem docente é o conhecimento, a pesquisa, a reflexão e a formação em instituições superiores de ensino ou no local de serviço, com seus pares, o que possibilita o desenvolvimento pessoal e profissional necessário à superação dos desafios e à construção de novas práticas e posturas diante da educação escolar”, avalia Mirna Araújo, coordenadora-geral de formação de professores da Secretaria de Educação Básica (SEB) do MEC.
Segundo ela, o objetivo do 3º ciclo é ampliar o letramento com estímulo à organização do trabalho pedagógico e à integração entre os componentes curriculares, respeitando a especificidade de cada campo do saber. Para isso, propõem-se projetos e sequências didáticas em que temáticas de diferentes componentes curriculares sejam mobilizadas para a compreensão da realidade e o desenvolvimento de valores humanos.
Com início previsto para abril de 2015, a formação presencial dos professores começou em agosto deste ano em 4.778 municípios brasileiros, mas atrasou em alguns estados. No Ceará e na Bahia, totalizando 600 municípios, a formação teve início em novembro e deve terminar em março de 2016. Já em São Paulo, a formação realizada nos 123 municípios atendidos pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) não começou e, segundo o MEC, ainda não há previsão de início. Além disso, a carga horária dos cursos presenciais foi reduzida pela metade, passando de 200 horas para 100 horas no caso dos orientadores de estudo, e de 160 horas para 80 horas no caso dos professores. “O ajuste fiscal realizado pelo governo alterou a carga horária, mas sem comprometer a qualidade do processo formativo”, explica Mirna. Já o número de municípios que aderiram ao Pnaic aumentou a cada etapa, como indicado no gráfico a seguir.
Aprender sempre
A rapidez da disseminação de informações e conhecimentos na sociedade atual exige a formação contínua do profissional de educação, que deve estar preparado para acompanhar as inúmeras transformações e suas demandas. O curso presencial do Pnaic propõe estudos e atividades práticas, como planejamento das aulas, processo de avaliação para acompanhamento da aprendizagem e utilização dos materiais didáticos e pedagógicos elaborados pelo MEC. Essa formação se faz ainda necessária nas regiões afastadas dos grandes centros urbanos, por conta da distância dos centros universitários e de pesquisas.
“Como parte das iniciativas que visam à melhoria da qualidade da educação, as ações formativas para professores são consideradas estratégicas, uma vez que o profissional é responsável por selecionar e organizar o conhecimento, bem como articular as condições que propiciam a aprendizagem dos alunos”, considera Raimunda Alves Melo, professora assistente e supervisora do Pnaic na Universidade Federal do Piauí (UFPI). “Em algumas regiões rurais do Piauí ainda não dispomos de energia elétrica, fato que inviabiliza a participação em formações a distância. Por isso, o programa de formação dispõe de bolsas de estudo que ajudam a custear o deslocamento dos professores.”
Também é preciso levar em conta que a formação inicial dos profissionais é, por vezes, deficitária. “Os professores não são formados para entender e compreender a realidade da escola pública brasileira. Há questões como didática, técnicas e estratégias de ensino que estão ausentes da formação universitária. O Pnaic deve centrar esforços na formação do professor, oferecendo instrumentos para que ele possa acompanhar o passo a passo da aprendizagem do aluno ao longo do curso, percebendo seus avanços, identificando suas dificuldades e garantindo seu aprendizado”, diz Anna Helena Altenfelder, supervisora do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).
A valorização do professor é um dos elementos que contribuem para a melhoria na qualidade da educação brasileira. “São vários fatores que influenciam na alfabetização, mas, no fundo, é um processo de ordem social. Além de professores mais bem formados, a escola precisa ter infraestrutura adequada, disponibilizar um ótimo material didático, oferecer uma boa alimentação, já que as carências dos alunos são enormes. O maior desafio não é alfabetizar até os 8 anos, mas alfabetizar bem. A questão maior não é o prazo, mas a qualidade. O atraso na alfabetização prejudica o desenvolvimento intelectual e social das crianças e dos jovens. É importante frisar que a alfabetização pode não acontecer até os 8 anos de idade, mas o Estado tem a obrigação de garantir a alfabetização para todos”, avalia Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.